As roturas crônicas ou negligenciadas do tendão calcâneo (tendão de Aquiles) são muito comuns e podem levar a quadro de prejuízo funcional ao paciente. O tratamento em geral requer cirurgia que quando bem indicada pode levar a bons resultados.
Introdução
As roturas do tendão calcâneo, também conhecido como tendão de Aquiles são denominadas crônicas quando o tempo entre a lesão e o início do tratamento supera o período de 4 semanas.
As principais causas para as lesões crônicas do tendão de Aquiles incluem:
- rupturas espontâneas negligenciadas
- falhas na reparação do tendão
Uma ruptura aguda geralmente ocorre em homens de meia-idade, ocasionalmente ativos e geralmente ocorre sem quaisquer pródromos ou sinais de alerta.
A ruptura ocorre mais comumente cerca de 2 a 6 cm proximais à inserção, local onde ele fixa-se no osso calcâneo, e em geral o paciente refere um estalo agudo (síndrome da pedrada) com dor intensa na parte posterior do tornozelo com inchaço. Logo após a lesão o paciente pode referir certa incapacidade para andar, subir escadas, ladeiras ou correr, assim como uma sensação de desequilíbrio e fraqueza.
O paciente geralmente permanece como a parte afetada e, uma vez reduzidos os sinais de inflamação, ele retoma lentamente a atividade.
Diagnóstico das Roturas Crônicas do Tendão Calcâneo
Uma lesão crônica do tendão calcâneo pode apresentar um sinal óbvio de ruptura com um gap palpável ou visível na continuidade do tendão de Aquiles na região posterior da perna (Figura 1), no entanto em alguns casos esse espaço pode já ter sido preenchido por algum grau de fibrose.
Além disso testes clínicos para testar a integridade do tendão de Aquiles como o teste de Thompson (teste de compressão da panturrilha) (Figura 2) o teste de Matles (comparação do equino fisiológico) (Figura 3), podem dar a pista diagnóstica.
Durante os testes clínicos, é possível que ocorra algum resultado falso positivo, devido à formação de uma fibrose ou aderência entre os cotos tendíneos.
Os pacientes também são capazes de realizar uma flexão ativa do tornozelo na presença de ruptura do tendão de Aquiles devido à ação de outros músculos flexores tais como o flexor longo do hálux, flexor longo dos dedos, fibular longo e tibial posterior. Avaliar de maneira bilateral identificando a fraqueza do lado afetado pode ser uma dica que auxilia na suspeita diagnóstica.

Figura 1: Gap palpável na região posterior da perna em local da descontinuidade tendínea.

Figura 2: Teste de Thompson, visualizando a compressão dos gastrocnemios. Deve-se observar a movimentação do pé. Quando ela não ocorre, há lesão do tendão calcâneo constatada.

Figura 3: Teste de Matles, visualizando a perda do equino fisiológico do pé. Na imagem à direita o pé não aponta para cima como seria o esperado.
Exames de Imagem
Indiscutivelmente a ressonância magnética (Figura 4) é o exame padrão-ouro par avaliação da área envolvida. As imagens conseguem com clareza avaliar tanto a extensão da lesão, quanto a qualidade do tecido residual e possíveis lesões que possam estar associadas.

Figura 4: Corte sagital do exame de ressonância magnética demonstrando a lesão tendínea crônica com o gap entre os cotos distais e fibrose no espaço.
Tratamento para Roturas Crônicas do Tendão Calcâneo
A reconstrução da lesão crônica do tendão de Aquiles é um desafio, e em geral, os resultados são menos previsíveis do que quando o tratamento é realizado na fase aguda. Em geral o tratamento é cirúrgico, exceto quando os riscos de saúdes apresentados pelo paciente superam os benefícios da reconstrução.
O tipo de reparo depende principalmente da idade da lesão e da magnitude da lacuna que existe entre o tendão proximal que sofreu encurtamento e o tendão saudável distal. O comprimento da lacuna é considerado após o desbridamento das áreas fibróticas e degeneradas dos cotos tendíneos e não o espaço existente entre a parte proximal e distal do tendão.
Opções de Cirurgia para Roturas Crônicas do Tendão Calcâneo
Reparo Primário
Conduta de exceção, o reparo primário com ou sem alongamento da fascia proximal, e pode ser realizado quando a lacuna entre as extremidades saudáveis do tendão após o desbridamento é inferior a 2 cm.
Transferências Tendíneas
A transferência do tendão FLEXOR LONGO DO HÁLUXF é um procedimento capaz de criar uma nova inserção e preencher a lacuna no tendão de Aquiles lesionado (Figura 5).
O tendão é colhido pela mesma incisão do desbridamento dos cotos degenerados do tendão calcâneo e une as duas extremidades sendo inserido no osso calcâneo, na região de inserção do tendão de aquiles. O músculo é sinérgico e o mais forte de todas as transferências disponíveis.

Figura 5: Imagem demonstrando da esquerda para a direita a sequencia cirúrgica para transferência do tendão flexor longo do hálux para o calcâneo.
A transferência do tendão FIBULAR CURTO é uma excelente opção para o aumento de um reparo primário, principalmente quando o paciente já apresenta algum grau de lesão ou degeneração do tendão fibular (por ser uma fonte possível de dor que será removida).
O tendão é colhido através de uma incisão na base do quinto metatarso e retirado através da ferida cirúrgica atrás da fíbula. O comprimento do tendão é relativamente curto, mas é suficiente para ser inserido no calcâneo no sentido dorsoplantar por meio de um parafuso de interferência e também pode ser acoplado ao coto distal do tendão de aquiles.
Enxerto Tendíneo Livre
Alguns pacientes apresentam lacunas muito grandes devido à perda de substância do tendão que não é passível de reparo por transferências tendíneas, nesses casos o tendão pode ser reconstruídos com enxerto livre, sendo os mais utilizados os flexores do joelho, principalmente através de técnicas minimamente invasivas. (Figuras 6-8)

Figura 6: Retirada do enxerto de tendão flexor do joelho.

Figura 7: Desbridamento do tendão doente

Figura 8: Passagem do enxerto e fixação no calcâneo
Reabilitação da cirurgia de Roturas Crônicas do Tendão Calcâneo
A reabilitação é um passo fundamental no pós operatório desses procedimentos. Em geral requer imobilização com bota ortopédica removível de cano longo, carga precoce, exercícios de mobilidade para amplitude de movimentos e liberação e aderências bem como ganho de força gradual. Ela é lenta, prolongada e faz parte fundamental nos bons resultados alcançados pelos pacientes.
Complicações
As principais complicações associadas aos procedimentos cirúrgicos de reconstrução do tendão de aquiles estão relacionadas a cicatrização a ferida e infecção. Além disso é esperado algum grau de fraqueza e diminuição do volume da panturrilha em relação ao lado contralateral.
Conclusão
A lesão negligenciada ou crônica do tendão de aquiles pode trazer problemas funcionais ao paciente e em geral, o seu tratamento é cirúrgico. O reparo e a reconstrução deste tendão dependem de múltiplos fatores que precisam ser levados em consideração. Em geral a escolha da técnica depende da familiaridade do cirurgião com ela bem como do tipo de lesão apresentada pelo paciente.
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Referências
uptodate.com
FAQ
1. Quanto tempo posso esperar até operar uma lesão aguda do tendão de Aquiles?
Em geral o quanto antes o tratamento for iniciado melhor, sendo o período de 4 semanas considerado o limite que separa as lesões agudas das crônicas e modifica o prognóstico. Isso ocorre pela formação de tecido de cicatriz nesse período e perda da capacidade de reparo dos cotos lesados.
2. O que acontece se eu não tratar um tendão calcâneo que rompeu?
O tendão calcâneo é o principal flexor plantar do tornozelo e o tendão mais forte o corpo humano. Sua ausência pode levar principalmente a fraqueza para deambular bem como incapacidade para subir escadas, ladeiras e praticar boa parte das atividades físicas.
3. É possível andar com tendão de Aquiles rompido?
Sim. Passada a fase mais aguda, a dor não costuma ser limitante, porém a fraqueza pode impedir de subir escadas, correr, subir ladeiras bem como de apresentar um marcha normal.